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#91 - Sky Metalwala: Sequestro ou Encobrimento? | DESAPARECIDOS

Foto do escritor: Rodolfo BrennerRodolfo Brenner

Pense no cenário: uma mãe liga para a polícia avisando que seu filho de 2 anos tinha sido roubado de dentro do seu carro. Quanto mais as investigações avançam, menos a história dela faz sentido.


Essa é a versão escrita do episódio #91 - Sky Metalwala: Sequestro ou Encobrimento?



Sky Elijah Metalwala nasceu no dia 06/09/2009 na cidade de Bellevue, em Washington. Tanto o pai quanto a mãe dele eram imigrantes: o Solomon Metalwala tinha nascido no Paquistão e a Julia Biryukova era ucraniana, nascida quando o país ainda fazia parte da União Soviética. Eles se conheceram em 1997, na loja de conveniência da família do Solomon, quando Julia tinha 15 anos e Solomon tinha 21. Os dois foram até uma festa, ficaram e rapidamente engataram um namoro. Em 1999, Julia se formou na Bellevue High School, enquanto a família do Solomon fechou a loja de conveniência e decidiu abrir um restaurante, onde ele foi trabalhar.

Nesse ano eles decidiram morar juntos em um apartamento em Bellevue. Aqui também iniciaram alguns atritos: segundo testemunhas, era comum que o casal gritasse muito um com o outro. Julia também se queixou que Solomon era muito controlador.- Mesmo assim, eles decidiram se casar em 2003: com pouco dinheiro, a cerimônia foi feita na cozinha da casa dos pais do Solomon. Nessa época a Julia já era naturalizada, mas Solomon estava enfrentando dificuldades em seu processo legal, então o casamento foi uma forma de estabilidade para ele, que agora se casaria com uma americana.

Em 2005, Solomon, que era muçulmano, se converteu ao cristianismo junto com a esposa. Isso causou uma briga entre os pais do Solomon e a Julia, algo que impactava diretamente no casamento. As questões financeiras também não iam bem: o restaurante da família do Solomon começou a enfrentar problemas financeiros por conta da concorrência que havia com outros estabelecimentos que foram abrindo nas proximidades. Mesmo com esses problemas, em 2007, nasceu a primeira filha do casal, Maile.


Sky com seu pai, Solomon


Em 2008 aconteceu a Grande Recessão, um declínio na economia que começou nos Estados Unidos e acabou se espalhando por todo o mundo. Lá é comum usar uma linha de crédito chamada Hipoteca, que dá um prazo muito grande para ser pago, contando que você coloque o seu imóvel como garantia. Desde 2005, os valores dos imóveis estavam aumentando sem parar, o que gerava mais e mais linhas de crédito, porém, os cidadãos continuavam ganhando a mesma coisa. Por conta disso, muitos proprietários começaram a hipotecar suas casas para pagar os próprios imóveis. A inflação começou a ficar muito alta, e o governo precisou tomar algumas medidas, como diminuir as linhas de crédito. Isso fez com que os valores dos imóveis diminuíssem, ou seja, se antes você conseguia emprestar um alto valor e com juros baixos porque sua casa valia muito, hoje você emprestaria pouco com um juros alto porque sua casa valia muito menos.

Quando essa bolha imobiliária definitivamente estourou no começo de 2008, empresas fecharam, milhares foram demitidos e muitos cidadãos simplesmente abandonaram suas casas, já que não conseguiam mais pagar a hipoteca. Essa recessão afetou profundamente a família, que tinha acabado de comprar uma casa no valor de US$ 800.000 em Kirkland, só que eles ainda tinham dívidas do comércio e da antiga casa deles. As contas atrasaram e o banco tomou o imóvel, obrigando a família a voltar para Bellevue. No meio de tudo isso, Julia ficou grávida de Sky.


Maile e Sky


Após o nascimento do filho, a saúde mental da Julia se deteriorou muito: ela passou a sofrer de TOC (Transtorno Obsessivo Compulsivo), limpando a casa diversas vezes por dia e brigando com o marido e com a filha caso eles sujassem ou interrompessem qualquer um dos seus rituais de limpeza. Inclusive os vizinhos do casal chamaram a polícia várias vezes por perturbação de sossego já que Julia costumava passar o aspirador na casa o dia todo, inclusive após as 22h.

No início de 2010, o TOC estava ficando cada vez mais grave e Julia se internou em um hospital psiquiátrico. Lá, ela relatou que sonhava constantemente que matava seus filhos. Mesmo assim, os psiquiatras da instituição não acreditavam que isso a tornasse inapta para ser mãe. Após receber alta, Solomon pediu o divórcio. Depois de ter saído de casa, Julia mandava mensagens dizendo que tinha ideações suicidas, além de tentar proibir que ele tivesse direito de visita aos filhos. Ela foi internada mais duas vezes, e somente na terceira ela não foi mais considerada um risco para si mesma e para as outras pessoas. Enquanto ela estava no hospital psiquiátrico, o banco executou a hipoteca da casa, obrigando Solomon a voltar para a casa dos seus pais.

Quando Julia saiu do hospital, começou uma verdadeira batalha judicial entre o ex casal: nos documentos levados para a corte, Julia dizia que Solomon era um homem muito agressivo e que maltratava ela e as crianças. Ela entrou com um pedido de restrição contra Salomon alegando que ele havia deixado marcas roxas na Malie, e ele foi proibido de ver os filhos por 1 ano. Entretanto, o serviço social investigou as alegações e não encontrou qualquer indício que Solomon agredisse os filhos. Do outro lado, Solomon dizia que Julia não havia melhorado do TOC, que ela não fazia comida para não sujar a cozinha e não menos deixava os filhos dormirem nas próprias camas para não desarrumá-las.

Em setembro de 2010, o tribunal deu a custódia das crianças para a Julia, e como Solomon estava sofrendo aquela proibição por conta da denúncia que ela tinha feito, ele não tinha nenhum direito a visitas. Ele entrou com recursos, mas Julia não queria abrir mão da guarda. Ela inclusive ofereceu um acordo para desistir da pensão alimentícia se Solomon deixasse ela ir morar com as crianças no Arizona, mais de 2 mil km de distância, mas ele recusou.

Em novembro de 2011, após mais de um ano de trâmites legais, o tribunal ordenou que o casal passasse por uma audiência de mediação para resolver de vez a questão da guarda. Essa audiência aconteceu no dia 3 de novembro, e as partes decidiram que Julia ficaria com a guarda e Solomon teria direito a visitas. Porém, assim que saiu da audiência, Julia ligou para o seu advogado e pediu a anulação do acordo alegando que ela teria sido pressionada a assinar.


Julia e Solomon: o casamento acabou em 2010


Após a separação, Julia e os filhos estavam morando em um apartamento em Redmond, Washington. Na manhã do dia 06/11/2011, Sky teria acordado doente e Julia decidiu levar ele juntamente com a filha até o Overlake Medical Center, que ficava em Bellevue. Quando estava passando pela 112th Avenue, em um trecho perto da Washington State Route 520, o carro teria ficado sem gasolina. Ela então decidiu sair junto com a Malie para procurar um posto, mas deixou Sky no carro, preso na cadeirinha. Elas caminharam mais de 1,5 km até encontrar um posto Chevron, mas ao invés de comprar gasolina, ela pediu para que uma amiga fosse buscá-la.

Após passar mais de uma hora desde que tinha estacionado o carro com o filho dentro, a amiga buscou Julia e Maile no posto e levou de volta até o local, mas quando chegaram lá, viram que Sky tinha sumido. Julia então ligou para a polícia e relatou o desaparecimento. Foi realizada uma busca completa com cães farejadores em um raio de 20 quarteirões próximos de onde o carro estava estacionado, mas não havia nenhum sinal de Sky. Quando desapareceu, Sky estava com 2 anos. Ele tinha olhos castanhos, cabelo escuro e estava usando um moletom verde escuro com capuz e uma calça listrada azul e cinza.


Região onde o carro o carro com Sky teria sido estacionado


Assim que Julia deu seu depoimento na delegacia, o seu relato começou a ser questionado, já que não fazia sentido uma mãe deixar seu filho doente dentro do carro. Uma perícia no carro não encontrou nenhuma evidência de entrada forçada, já que o carro estava destrancado, porém, foi provado que havia gasolina suficiente no tanque e que o veículo estava funcionando normalmente. Além disso, Julia estava sem sua bolsa, carteira ou telefone celular, inclusive sem nenhum documento do Sky. Ela também não pediu ajuda em alguma casa próxima.

Quando começou a ser questionada sobre essas inconformidades, Julia alegou seu direito de permanecer calada e se recusou a fazer um teste do polígrafo. Apesar disso, ela permitiu que sua casa fosse revistada sem a necessidade de um mandato. Solomon foi informado do desaparecimento e cooperou com as autoridades. Foi feita uma perícia em ambas as casas, mas não havia sinal do Sky. Solomon também se submeteu a dois testes de polígrafo: o primeiro deu como inconclusivo e o segundo nunca teve o resultado divulgado.

O FBI entrou no caso poucos dias depois, quando ficou de conhecimento público que tanto Julia quanto Solomon já tinham respondido legalmente por deixar os filhos dentro do automóvel em 2009. Isso parece muito absurdo, mas nos Estados Unidos isso é um problema real, com bebês morrendo todos os anos por conta do calor. Na maioria dos casos o esquecimento é acidental, tanto que é um fenômeno estudado chamado "Síndrome do bebê esquecido". A polícia passou a acreditar que Sky nem ao menos estaria no carro naquele dia, isso porque, apesar de diversas testemunhas terem visto o carro parado no acostamento, nenhuma delas se lembrava de um bebê lá dentro. Os vizinhos de Julia também relataram que, apesar da família ser um tanto reclusa, ninguém tinha visto Sky há pelo menos duas semanas.


Investigador apresenta fotos de Sky para a imprensa


Como Sky já não era visto a um tempo, a principal teoria era de que tudo tenha sido encenado. Chamou a atenção que a história que Julia contou era muito parecida com o enredo de um episódio da série Law & Order: Special Victims Unit que tinha ido ao ar recentemente: no episódio “Missing Pieces”, um casal chama as autoridades para dizer que seu carro tinha sido roubado com seu filho dentro, porém, fica provado que eles tinha matado a criança acidentalmente e encenado o sequestro. Os primeiros a notarem essa semelhança foram os policiais da polícia de Bellevue.

O major Mike Johnson disse em entrevista: "Sei que há várias pessoas no centro de operações do posto de comando que deram uma olhada naquele episódio e comentaram que é surpreendentemente semelhante”. Coincidentemente, o episódio tinha sido transmitido pela primeira vez duas semanas antes e reprisado na área de Redmond na noite anterior ao desaparecimento do Sky. Além disso, Solomon alegou que a série Law and Order: SVU é a favorita de Julia.

Outro ponto questionado foi que, mesmo antes do desaparecimento, a Julia postava muitas fotos dela com a filha Maile, mas só havia uma única foto com Sky, o que era estranho que uma mãe não divulgasse o desaparecimento do próprio filho. Por conta desses fatos, os investigadores declararam publicamente que não acreditavam que Sky tinha sido sequestrado por um estranho e que Julia de alguma forma estava envolvida no desaparecimento. Só que havia um conflito jurídico em indiciar a Julia como suspeita, pois não havia provas suficientes para corroborar ou não com a história, ou seja, ela facilmente sairia livre se fosse indiciada. A ideia da polícia então foi usar a própria história da Julia contra ela, uma vez que o fato dela ter deixado Sky sozinho no carro por si só já seria considerado abandono de incapaz.


Imagem do episódio Missing Pieces de Law and Order: SVU


Enquanto as investigações aconteciam, o caso começou a ganhar força na mídia, mostrando as contradições que vinham na parte da Julia. Após duas semanas do desaparecimento, ela falou pela primeira vez publicamente sobre o caso: através de um e-mail para a ABC News, ela disse que não sabia onde seu filho estava, além de chamar Solomon de “paquistanês sádico”. O Departamento de Serviços Sociais e de Saúde do Estado de Washington decidiu tirar a Maile da casa de Julia por considerar seu comportamento “estranho” e a menina foi colocada em um orfanato até o seu pai conseguir a sua guarda definitiva em 2012.

Após anos parado, em 2015, o novo chefe de polícia de Bellevue, Steve Mylett, fez um apelo público para que Julia contasse algo. Ele disse: “Estou convencido de que você tem a chave para encontrar Sky”. Nesse mesmo ano, Julia se casou novamente e teve mais um filho, e novamente o Departamento de Serviços Sociais precisou intervir: foi relatado que ela continuava com TOC severo e que seu marido, um homem chamado Alan Morgan, era um criminoso de carreira e que inclusive já tinha perdido a guarda de uma filha de um casamento anterior. Segundo testemunhas, Julia e Alan brigavam muito, e ela chegou a denunciar ele à polícia por agressão. Ele foi preso, mas ela fez visitas regulares a ele na cadeia, mesmo tendo ganhado uma ordem de restrição contra ele.


Julia deixando o tribunal junto com seu advogado


Em 2019, depois de mais problemas com o novo marido, houve um tribunal para acusá-lo de violar as ordens de restrição que ela tinha contra ele. Alan alegou que Julia era “atormentada” e que não confiava nos cuidados dela para com o filho deles. A imprensa estava do lado de fora do tribunal, na expectativa de que ela falasse do caso de Sky, mas ela se recusou. Em 2021, foi a vez da Julia ser presa, desta vez sob acusação de furto em uma loja. Nesse mesmo ano, o desaparecimento de Sky Metalwala completou 10 anos, e a polícia de Bellevue divulgou uma progressão de imagem de como Sky estaria com 12 anos de idade.


Progressão de idade de Sky


• FONTES: The Seattle Times, ABC News, Bellevue Reporter, NBC, In Pursuit of Justice, Talk Murder with Me.

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