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#94 - O Assassinato da Família Miyazawa | CRIMES REAIS

Foto do escritor: Rodolfo BrennerRodolfo Brenner

Na véspera do Ano Novo, 4 membros da mesma família foram assassinados dentro da própria casa, no Japão. Mesmo com diversas pistas, a polícia tem dificuldade para encontrar suspeitos e até mesmo as motivações para o crime.


Essa é a versão escrita do episódio #94 - O Assassinato da Família Miyazawa.



O caso aconteceu na cidade de Setagaya, distrito especial que fica na região metropolitana de Tóquio. Segundo dados de 2023, Setagaya tem aproximadamente 940 mil habitantes, sendo a maior população e a segunda maior área entre os distritos especiais de Tóquio. Era lá, no bairro de Kamisoshigaya, que vivia a família Miyazawa, composta pelos pais, Mikio e Yasuko, e os filhos Niina e Rei.

Mikio tinha 44 anos e trabalhava na Interbrand, uma empresa de marketing que realiza consultoria em áreas de estratégia, experiência, embalagem e naming para grandes clientes como a Microsoft, a Nissan e a Xerox. Yasuko tinha 41 anos e era professora. Ambos foram descritos como muito simpáticos e que se davam bem com todo mundo. Quanto aos filhos, Niina tinha 8 anos e estava na 2ª série. Ela adorava brincar e praticar atividades físicas como futebol e balé. Não se tem muitas informações quanto ao filho mais novo, Rei, apenas que ele tinha 6 anos e estava apresentando alguns problemas na fala. Por conta disso, seus pais estavam procurando profissionais para ajudá-lo.


Yasuko, Mikio, Rei e Niina


O bairro onde os Miyazawa moravam, originalmente, tinha mais de 200 casas, mas atualmente existiam apenas 4 famílias habitando. Esse êxodo se deu por conta de um parque que estava em constante expansão, e muitas das propriedades locais acabavam sendo desapropriadas pela prefeitura. Um dos elementos do parque era uma pista de skate que estava localizada logo atrás da casa da família. Ali, vários adolescentes passavam a noite bebendo e conversando, o que incomodava muito os Miyazawa. Segundo relato da Haruko, a mãe da Yasuko, tanto a sua filha quanto seu genro já tinham confrontado pessoas que ficavam ali, inclusive alguns jovens que pertenciam a Bosozoku, que era uma gangue de motoqueiros. Por conta de toda essa perturbação, os Miyazawa estavam com planos de se mudar no início de 2001.


Casa germinada em que os Miyazawa dividiam com a família da Yasuko


No dia 30/12/2000, os Miyazawa estavam se preparando para o feriado de Ano Novo: eles foram passear em um shopping por volta das 18h. Quando voltaram, Yasuko ligou para conversar com a mãe às 19h e Niina foi a casa de um vizinho assistir TV até às 21h30. O último registro de atividade foi um e-mail que Mikio leu às 22h38.

No dia 31/12, Haruko, a mãe de Yasuko e que também era vizinha de parede da família, tentou ligar para a filha para fazer planos de se encontrar mais tarde, mas a ligação não chegou a ser completada. Preocupada, ela foi até a casa deles e tocou a campainha, mas não obteve resposta. Haruko então usou as chaves reservas que ficavam com ela para entrar na casa, e foi aí que ela se deparou com um verdadeiro cenário de horror: logo na entrada da casa foi possível ver o corpo do pai, Mikio, caído no final da escada. No topo de outra escada que ia para o terceiro andar estavam os corpos da Yasuko e da Niina, enquanto o corpo do pequeno Rei estava dentro do seu quarto, deitado na sua cama. Mikio, Yasuko e Niina foram esfaqueados várias vezes, enquanto Rei foi estrangulado até a morte. Em choque, Haruko saiu correndo e chamou a polícia.


Pista de skate que ficava atrás da casa em Setagaya


A polícia de Tóquio foi até o local e começou a interrogar a família da Yasuko: An Irie, a irmã de Yasuko, disse que ela e seu marido tinham ouvido um barulho alto vindo da casa dos Miyazawa por volta das 23h30, algo que se assemelhava a uma batida. Segundo a linha do tempo que a polícia começou a construir, o ataque teria acontecido após às 22h: primeiro, o agressor cortou a linha de telefone da família, por isso a mãe de Yasuko não tinha conseguido ligar para ela. Depois, ele entrou por uma janela do segundo andar, que dava para o quarto do Rei. Ao encontrar o garoto, ele teria o estrangulado para evitar que ele gritasse. Depois de sair do quarto, é provável que o assassino tenha feito algum barulho, que chamou a atenção de Mikio, que estava no escritório que ficava no primeiro andar. Ao subir as escadas, ele foi atacado e teria rolado escada abaixo, e esse seria o barulho que a família da Yasuko ouviu da outra casa. Por fim, o assassino encontrou Yasuko e Niina e esfaqueou ambas.

Depois de matar a família, o assassino permaneceu no local por várias horas: segundo o que foi encontrado na perícia, ele tirou um cochilo no sofá e depois comeu 4 sorvetes que estavam no freezer da casa. Ele também juntou vários documentos e cartões de banco da família na sala de estar, inclusive usou um para tentar comprar ingressos para um peça de teatro na Shiki Theater Company, que por acaso era um dos locais que o Mikio prestava serviço, mas não conseguiu. Às 10h05 do dia seguinte, o computador foi usado novamente, dessa vez para entrar no site da Interbrand – que era a empresa que o Mikio trabalhava – e também no site da escola em que Yasuko lecionava. Sobre esses sites específicos, não se sabe porque o assassino acessou, apenas que todos estavam favoritados no navegador que a família usava.

Também foram encontrados vários itens dentro da banheira, incluindo as embalagens de sorvete que o assassino consumiu, recibos de trabalho do Mikio, papeis da escola da Yasuko e alguns itens manchados de sangue. A polícia acreditava que ele pretendia deixar os objetos de molho, mas desistiu ou esqueceu. A única coisa roubada foi uma quantia de dinheiro que estava na carteira das vítimas, cerca de ¥ 150.000, que equivale a R$ 5.788. A polícia acabou descartando que um roubo fosse o motivo principal, visto que havia mais dinheiro no escritório, e nenhum objeto de valor foi levado.


Polícia investigando a cena do crime


Uma das armas usadas no crime foi uma faca de sashimi, que foi encontrada na cozinha da família. Através de rastreio, a polícia descobriu que a faca tinha sido comprada em um supermercado local um dia antes. Essa faca foi usada contra Mikio e acabou quebrando durante o ataque. A outra arma foi uma faca da própria casa dos Miyazawa, que foi usada para esfaquear Yasuko e Niina. Além das facas, haviam muitas outras evidências na cena do crime: pegadas de sangue por todo o ambiente; um kit de primeiros socorros aberto com o sangue da Niina, o que indicava que alguém havia tentado estancar o sangue dela; além de toalhas e absorventes com sangue de um desconhecido, possivelmente do assassino, que teria se machucado durante o ataque. Agora, a evidência mais estranha de todas: no banheiro do segundo andar havia cocô no vaso sanitário, que após análise foi confirmado ser da mesma pessoa que deixou sangue nas toalhas.

A polícia recuperou todas as roupas usadas pelo assassino, pois elas tinham sido abandonadas no interior da residência. As roupas eram: um chapéu cinza, uma jaqueta preta, uma camiseta de manga comprida branca e roxa, uma pochete verde militar, um par de luvas pretas, um cachecol xadrez azul com vermelho e um lenço preto, além de um tênis branco da marca Slazenger, que correspondia ao das pegadas com sangue pela casa.- Com base no tamanho das roupas, o assassino deveria ser um homem, com mais ou menos 1.70 m, calçando o equivalente a 40/41. Através do rastreio dos itens, a polícia descobriu que tanto a camisa quanto as luvas e o chapéu eram itens vendidos em uma rede de lojas asiáticas chamada MaruFuru, o que acabou não ajudando.

Também existem duas evidências ligadas a roupas que podem indicar que o assassino não era japonês: lembram do tênis branco encontrado na casa? Tanto o modelo quanto o tamanho específico não eram vendidos no Japão, apenas na Coreia do Sul. Já as roupas tinham traços de sais minerais não encontrados na água do Japão, o que indicava que elas teriam sido lavadas em outro país. Por fim, a pochete verde continha areia que também foi analisada, e foi concluído que ela tinha vindo da região sudoeste dos Estados Unidos, provavelmente da Califórnia. Isso significava que a pochete era usada e tinha vindo de lá, ou que seu dono esteve lá recentemente. No final essa pista acabou não levando para nenhum lugar.


Roupas utilizadas pelo assassino da família Miyazawa


A polícia descobriu que ali, no parque atrás da casa dos Miyazawa, coisas estranhas estavam acontecendo nos meses anteriores ao crime: segundo relatos dos frequentadores do local, foram encontrados animais mortos e com sinais de tortura, principalmente gatos e pássaros. No dia 25/12/2000, a família do Mikio estava visitando os Miyazawa e a Yasuko contou para o sogro que ela tinha visto um carro estranho parado na frente da casa deles em mais de uma ocasião. Já no dia 27/12, uma testemunha disse que viu um homem suspeito parado, olhando em direção a casa da família.

No dia 29/12, um homem foi visto na estação de Seijogakuen-mae, que era a mais próxima da casa da família. Segundo testemunhas, ele teria entre 35 e 40 anos e usava roupas grandes, do tipo “skatista”, com descrições que batiam com as roupas encontradas dentro da casa. Eles também conseguiram relacionar que essa mesma pessoa foi a provável compradora da faca de sashimi usada no crime. No dia 30/12, um homem com as mesmas descrições foi visto perto da estação Sengawa, que também era próxima da casa dos Miyazawa.

Na mesma noite em que o crime aconteceu, um motorista de táxi contou que levou 3 passageiros “estranhos” do parque até a estação de Sengawa. Segundo ele, os 3 eram homens de meia-idade e não falaram nada durante a viagem. No outro dia, o taxista percebeu que um deles havia deixado uma mancha de sangue no seu banco, provavelmente vinda de um ferimento. Como ele não sabia ainda sobre o caso, ele acabou lavando o carro no mesmo dia.

A última pista veio de uma enfermeira que trabalhava no centro médico na estação de Tōbu–Nikkō: segundo ela, um homem deu entrada no local com um corte profundo na sua mão. A equipe médica estranhou que esse homem não informou seu nome ou o motivo do seu ferimento, que era grave o suficiente para expor os ossos da região da palma da mão. O homem foi liberado depois de fazer um curativo, e a equipe só reportou o que aconteceu depois de saber do assassinato da família Miyazawa. Segundo a equipe, esse homem teria mais de 30 anos e estava usando uma jaqueta preta e calça jeans.


Estação de Seijōgakuen-mae


Com todas essas pistas, vocês devem estar pensando: então a investigação foi rápida e certeira, não é? Na verdade, foi o oposto: mesmo com todos esses vestígios, a polícia não conseguia nomear um suspeito. Alguns meses depois, as autoridades apresentaram as roupas ao público, pedindo para que, quem tivesse informações, entrasse em contato.

A próxima pista veio em abril de 2001: próximo da residência foi encontrada uma estátua de Jizo, uma figura budista que, segundo as crenças, protege as crianças na vida após a morte. Na cultura japonesa, o remorso e a culpa são sentimentos muito fortes, por isso a polícia acreditava que existia uma chance muito grande da estátua ter sido deixada pelo próprio assassino, mas essa pista também não deu em nada. Em 2006, quando as técnicas forenses já estavam avançadas, o sangue encontrado na casa foi analisado novamente, gerando um perfil de DNA completo: o assassino seria do sexo masculino, com descendência do leste asiático e do sul da Europa, e tinha sangue tipo A. Tanto o perfil genético quanto as impressões digitais foram colocadas nos bancos de dados, mas nunca deram um resultado positivo.

O caso acabou ganhando notoriedade não somente no Japão, como no país inteiro, principalmente com o advento da internet. Com o passar dos anos, supostas pistas teriam aparecido, mas acabaram se provando falsas: a mais famosa delas seriam cartões postais que teriam sido levados pelo assassino e mandados de volta para a casa da família Miyazawa nos meses seguintes. Na realidade, esses cartões foram levados por um investigador, que posteriormente os enviou de volta. Outra pista falsamente apontada foi a existência de vestígios de corante vermelho dentro da casa. Isso poderia apontar que o assassino talvez tivesse envolvimento com metanfetamina, já que é comum utilizar fósforo ou iodo vermelho na produção da droga. A verdade é que esse corante era amplamente utilizado no início dos anos 2000, e não há nenhuma informação de que o assassino ou a família tivesse qualquer envolvimento com metanfetamina.


Faca utilizada no crime


Em dezembro de 2015, o autor de true crime Fumiya Ichihashi publicou um livro sobre o caso, com o nome "The Setagaya Family Murder Case". Segundo pesquisas feitas pelo próprio autor, ele conseguiu identificar um potencial suspeito, um homem chamado apenas de “R”. Segundo o livro, “R” era um ex-membro do exército sul-coreano e teria fugido do Japão após o crime. O autor conseguiu rastreá-lo até a província de Gyeonggi, que é onde fica localizada a capital, Seul. As impressões digitais encontradas na cena do crime teriam batido com a desse suspeito. De acordo com o livro, o motivo do crime seria o dinheiro que os Miyazawa teriam ganhado com a desapropriação da sua casa. Yasuko teria comentado sobre isso com outro homem, chamado no livro de “Sr K”, que por sua vez teria contado sobre isso com “R”. Não se sabe exatamente o que nesse livro é verdade, mas é difícil acreditar que, com um suspeito tão certeiro, a polícia japonesa não teria investigado.

Ainda em 2015, a irmã de Yasuko Miyazawa apresentou uma queixa contra a TV Asahi, alegando que um documentário feito pela emissora deturpou informações importantes ao afirmar que o assassino deveria ser alguém próximo e com problemas pessoais com a família.- Em 2019, foi anunciado que a casa dos Miyazawa seria demolida devido aos riscos de desabamento, já que o imóvel não era ocupado desde o assassinato. Porém, várias pessoas foram contra, incluindo as famílias de Mikio e Yasuko, já que a frente da casa servia para os locais deixarem vela, presentes e desejarem justiça para a família.

Em 2022, foi lançado o podcast Faceless, sobre o caso da família Miyazawa. O podcast tem 5 episódios e, além de uma revisão de todos os acontecimentos, também há entrevistas inéditas com o ex-chefe da polícia de Tóquio, Takeshi Tsuchita, e a mãe do Mikio, Setsuko Miyazawa. Em novembro de 2023, 10 estudantes do ensino médio teriam invadido a residência como forma de um teste de coragem, algo que é chamado de Kimodameshi. No Japão, invadir um local sem permissão – ainda mais o local de um crime – é considerado não só um crime, como também um ato extremo desrespeito. A repercussão foi tanta que a polícia garantiu que os menores seriam indiciados.

A última informação sobre o caso é de maio de 2024, quando foi realizada uma assembleia com representantes de Setagaya que decidiram por enviar um pedido para que o caso fosse reanalisado através de novas tecnologias.- Até hoje, a investigação do assassinato da família Miyazawa é considerada uma das maiores e mais caras da história do Japão: foram mais de 246 mil pessoas envolvidas, com mais de 12 mil evidências analisadas. Segundo os responsáveis, a investigação não parou, e existe uma recompensa de ¥ 20 milhões por informações que levem à prisão do assassino.


Polícia procura por informações sobre o caso da família Miyazawa em 2024


• FONTES: NHK, Japan Today, Unresolved Podcast, ABC News, Japan Times, Tokyo Metropolitan Police Department.

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1 Comment


Vivi Gomes
Vivi Gomes
Jan 31

Parece mesmo q o cara foi contratado na Deep web dos EUA p matar o pai da família e acabou matando todos na hora pq foi reconhecido pelo casal ou um dos dois. Eu investigativa tbm o DNA das crianças com o cara. Se uma foi adotada ou tem outro pai. Muito óbvio q ele não fez isso só já q no táxi estava com mais dois...

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