Em 1977, uma adolescente desaparece de forma misteriosa no Japão. O que ninguém imaginava é que, anos depois, descobririam que ela foi envolvida em uma trama internacional que envolvia sequestro e espionagem.
Essa é a versão escrita do episódio #31 - Megumi Yokota:

Megumi Yokota nasceu no dia 5 de outubro de 1964 na cidade de Nagoya. Ela era filha de Shigeru e Sakie Yokota, e tinha dois irmãos mais novos. Após o nascimento, a família Yokota se mudou para Hiroshima devido a uma transferência de seu pai, que trabalhava em um banco. Ela foi descrita como uma criança bastante alegre e criativa, que gostava de criar jogos usando folhas e pedras. A Megumi também gostava muito de cantar e de desenhar, e estudava caligrafia e balé clássico. Entretanto, o que ela mais gostava de fazer era ler: ela chegou a bater o recorde de aluno que emprestou mais livros durante o período em que estudou na mesma escola, e os livros que ela mais gostava eram os de histórias de detetive.

A família Yokota
Em julho de 1976, a família se mudou novamente, dessa vez para Niigata. Niigata é uma cidade costeira bastante grande, e é um ponto estratégico para o país, já que dali é possível pegar barcos para outros países (guardem essa informação). Em Niigata a família morava em uma área residencial tranquila, perto da Universidade da cidade. Aparentemente a Megumi não gostava muito de toda essa tranquilidade, e uma vez ela disse para a mãe, a Sakie, que ali era “um lugar muito solitário”.
Agora no ensino fundamental, Megumi ela passou a frequentar aulas de canto, tendo sido selecionada para cantar a parte solo de uma das músicas que eles apresentariam. Ela também era uma ótima jogadora de badminton.

A cidade de Niigata
Na manhã do dia 15 de novembro de 1977, Sakie viu Megumi sair de casa para ir para a escola, e as duas se despediram. Naquele dia a menina tinha treino de badminton, então já era esperado que ela chegasse um pouco mais tarde que o normal. Após o treino, ela e mais dois colegas de equipe saíram da escola por volta das 18h30, e cada um seguiu o seu caminho. Acontece que o tempo foi passando, e a Megumi não chegava em casa. Sua mãe ligou para uma das companheiras de treino e a menina respondeu que a última vez que ela tinha visto a Megumi foi depois do treino. Sakie foi até a escola na expectativa de encontrá-la, mas não havia mais ninguém lá. Foi nesse momento que ela decidiu chamar a polícia.
A situação de um desaparecimento de uma adolescente era tão incomum que, na noite do dia 15, a Delegacia Central de Polícia de Niigata classificou o caso como uma situação de emergência e convocou todos os seus funcionários: mais de 220 pessoas foram ajudar na busca. - No dia seguinte, 760 policiais foram acionados para expandir ainda mais a busca. Eles refizeram o caminho de Megumi várias vezes, e também utilizaram cães farejadores. Um dos cães indicou um ponto em uma esquina que ficava próxima da casa da família Yokota, mas ali o rastro se perdia. Como eles ainda não sabiam qual era a situação, as aulas da escola da Megumi foram suspensas.
O caso ganhou as manchetes do Japão, e o rosto da garota foi para os jornais e para as emissoras de televisão. A mãe da Megumi disse que ela, juntamente com familiares, amigos e voluntários procuraram por vários locais, de dia e a noite, mas não acharam nenhuma pista. Não existem muitas informações sobre as investigações, mas aparentemente a polícia começou a acreditar na hipótese de um sequestro, embora não tenha aparecido nenhum pedido de resgate. O caso ficou parado por 10 anos, até que apareceram novas pistas.

Megumi na época em que desapareceu
Em 1987, uma espiã norte coreana chamada Kim Hyun-hui foi presa após um atentado a bomba que matou 115 pessoas em um avião que com destino a Coreia do Sul. Kim se passava por japonesa e falava a língua de forma fluente. Depois de ser capturada, ela denunciou que havia um esquema de sequestro de cidadãos japoneses pela Coreia do Norte, e que, entre elas, estava uma garotinha chamada Megumi Yokota.

Kim Hyun-hui quando foi presa em 1987
No mesmo ano, um ex-espião norte-coreano chamado An Myeong-jin conseguiu fugir para o Japão e concordou em passar informações confidenciais em troca de exílio: ele reafirmou as coisas que a Kim Hyun-hui tinha falado, declarando ter participado do sequestro de dez japoneses, e novamente citou a Megumi. A notícia caiu como uma bomba: enquanto o Japão e a Coréia do Sul falavam em um escândalo internacional, a Coreia do Norte negava os sequestros e acusava seus vizinhos de conspiração.
O clima ficou mal resolvido até 2000, quando a Coréia do Norte começou a falar sobre esses supostos sequestros de cidadãos como parte de um programa secreto de espionagem. Segundo o que foi informado, o objetivo era que esses sequestrados ensinassem a cultura e o idioma de seus países de origem para agentes secretos que posteriormente poderiam passar sem serem percebidos.

Após a divisão das Coréias, a Coréia do Norte se tornou um país fechado e militarizado, comandado por Kim Il-Sung
Em 25 de março, o pai da Megumi formou o Comitê da Família das Vítimas de Abdução da Coréia do Norte. Tanto ele quanto a mãe de Megumi começaram a realizar palestras e colher assinaturas para que a Coréia do Norte liberasse mais informações sobre os sequestrados, porque até o momento não havia nenhum indício que a filha deles realmente estivesse entre eles. Dias depois, um porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da Coréia do Norte fez uma declaração se referindo a Megumi dizendo que o país não tinha necessidade ou interesse em sequestrar estudantes do ensino médio japonesas.
Em 17 de setembro de 2002, o primeiro-ministro japonês Junichiro Koizumi visitou a Coréia do Norte e se encontrou com Kim Jong II, presidente do Comitê de Defesa do país. Kim Jong II reconheceu oficialmente os sequestros e pediu desculpas. Segundo as informações que foram liberadas, 13 cidadãos japoneses foram sequestrados. Desses 13, oito haviam morrido, incluindo Megumi. Além do Japão, também existem casos de sequestros na Coreia do Sul, China, Tailândia, Romênia, França e Itália.

O Japão oficialmente reconhece 17 sequestrados, 4 a mais que a Coréia do Norte
Sobre como aconteceu o sequestro, foi dito que, naquele dia 15 de novembro de 1977, Megumi foi capturada por um agente chamado Sin Gwang-su. Os sequestrados foram levados de barco em um compartimento secreto, em uma viagem que durou cerca de 40 horas. Durante todo o caminho, Megumi chorou e chamou pelos pais. Em cativeiro, a menina se recusava a comer, e para acalmá-la os agentes norte-coreanos prometeram que se ela ajudasse eles a aprender japonês, eles a libertariam.
Enquanto esteve morando na Coréia do Norte, ela se casou com um sequestrado sul-coreado chamado Kim Young-nam e teve uma filha chamada Kim Hae-kyung. Após anos lutando contra a depressão, Megumi teria tirado a própria vida em 1993. Em novembro de 2004, a Coreia do Norte deixou alguns dos cidadãos voltarem para o Japão, incluindo seus parceiros e filhos que eles tiveram enquanto estavam sequestrados, o que foi um momento bastante simbólico e de esperança para o Japão.

Cidadãos sequestrados desembarcam no Japão
No mesmo ano, líderes norte-coreanos entregaram para Shigeru e Sakie uma urna com cinzas que seriam supostamente da Megumi, juntamente com fotografias e outros itens que seu marido tinha guardado. A Agência Nacional de Polícia, juntamente com o Instituto Nacional de Pesquisa em Ciência Policial realizaram um teste de DNA nas cinzas, mas os resultados foram inconclusivos.
Quanto às fotos de Megumi já adulta, a mulher apresentada realmente lembrava ela, e uma das pistas que poderiam confirmar isso é que, em uma das fotos, a mulher estava posando de uma forma muito característica, do mesmo jeito que o pai da Megumi tinha ensinado ela quando ela era criança. Entretanto, algumas autoridades disseram que elas poderiam estar adulteradas, e que as sombras não condiziam com a realidade.

Megumi já adulta (à esquerda), e quando ainda era criança (à direita): ambas posaram da mesma forma
Existem diversas teorias de que Megumi talvez ainda estivesse viva, ou teve um destino ainda mais sinistro do que o suicídio, mas não há nada que comprove ou mesmo que desprove isso. Outra coisa que nunca ficou explicada é porque ela foi a única criança sequestrada, sendo que todos os outros eram adultos. Alguns falam que talvez ela tenha sido pega por engano.
Em 2014, Sakie foi autorizada a encontrar a neta na Mongólia, e descobriu que já tinha até uma bisneta. Tanto Sakie quanto a filha de Megumi fizeram um exame de sangue e comprovaram que realmente são parentes.

Sakie Yokota se encontrou com a sua neta e sua bisneta em 2014
Shigeru Yokota infelizmente faleceu em junho de 2020, mas Sakie continua viva, e mesmo com 86 anos, ela continua palestrando sobre o desaparecimento da filha. Ela se converteu ao cristianismo por influência de uma missionária norte-americana, e isso deu forças para ela acreditar que a filha continua viva. Um dos irmãos da Megumi se tornou presidente da associação criada pelos pais, e acredita que existem pelo menos 900 casos suspeitos de desaparecimento que podem ter envolvimento da Coréia do Norte.
A história do sequestro de Megumi ficou tão famosa no Japão que foram produzidos muitos filmes, livros, e até um anime contando a história do caso. E embora ela não tenha sido a única, a luta dos seus pais transformaram ela no rosto dos japoneses sequestrados pela Coreia do Norte.

Shigeru e Sakie Yokota
• FONTES: G1, BBC, Cadaber, Abducted By North Korea, Coisas do Japão.
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