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#16 - Josef Mengele, o Anjo da Morte | SERIAL KILLER

Foto do escritor: Rodolfo BrennerRodolfo Brenner

Apesar de todas as atrocidades cometidos pelos nazistas durante a Segunda Guerra Mundial, alguns grupos ainda tentam legitimar essas ideias no século XXI. Nesse momento, é importante lembrar do Holocausto, que foi um dos momentos mais sombrios da História, onde milhões de pessoas morreram por causa dos ideais deturpados dos nazistas. Nesse contexto, um médico ficou conhecido pela crueldade de seus experimentos: em nome de uma “ciência” que nada tinha a acrescentar para a humanidade, fez coisas horríveis com os prisioneiros.


Essa é a versão escrita do episódio #16 - Josef Mengele, o Anjo da Morte:



A Primeira Guerra Mundial acabou em 1918 e alterou o mapa geopolítico da Europa: o Império Austro-húngaro, a Alemanha e o Império Otomano perderam territórios, estavam com a economia abalada e com a população desacreditada. Por causa disso, os Impérios acabaram se dissolvendo.

Em 28 de junho de 1919 foi criada a Liga das Nações através do Tratado de Versalhes: a ideia era garantir que não houvesse uma guerra mundial no futuro através de alguns pontos como a promoção da segurança coletiva, o desarmamento militar e naval e a preferência de se resolver disputas internacionais por meios pacíficos.

Enquanto nos países vencedores o que reinava era uma sensação de vitória, nos perdedores o nacionalismo estava crescendo e o sentimento de vingança estava aflorado, principalmente na Alemanha: o antigo Império Alemão foi dissolvido durante a Revolução Alemã, um movimento que aconteceu entre 1918-1919 e que foi marcado por um governo democrático conhecido como República de Weimar.


Mapa que mostra o território europeu antes e depois da Primeira Guerra Mundial


O problema é que a economia do país estava praticamente colapsando porque o Imperador alemão da época decidiu financiar os custos da guerra através de empréstimos, e o resultado foi uma inflação absurda: em outubro de 1923, ela chegou em 29.500% ao mês, com os preços duplicando a cada 3 ou 4 dias. Um pão, que custava 250 marcos em janeiro daquele ano, passou a custar 200 bilhões em novembro.

Nesse mesmo ano, Adolf Hitler tentou dar um golpe no governo alemão, porém foi uma tentativa frustrada. Ele só conseguiu chegar ao poder quando se tornou o Chanceler da Alemanha em 1933, após a nomeação dele pelo presidente Paul Von Hindenburg. Hitler tomou o poder, aboliu a democracia e fez uma campanha forte pelo armamento e militarização do país, apoiado pelos alemães, que estavam descontentes com o Tratado de Versalhes.

A mais cruel das características do regime na Nazista era a política de superioridade: segundo os intelectuais alemães do governo, a raça ariana era superior as demais, que acabaram sendo reprimidas através de medidas de eugenia, ou seja, de deixar o país o mais “ariano” possível. Dentre as raças consideradas inferiores os mais perseguidos foram os judeus, os ciganos, os eslavos (principalmente poloneses, sérvios e russos) e os negros. Além disso, homossexuais e pessoas com deficiência também eram excluídos. Com o passar do tempo, o governo decidiu não só excluir, mas retirar essas pessoas de circulação e colocá-las em campos de concentração, e é aqui que a figura do Josef Mengele aparece.


Adolf Hitler comandou a Alemanha entre 1933–1945


Josef Mengele nasceu em Günzburg, na Baviera, em 16 de março de 1911. Ele era o filho mais velho do casal Walburga e Karl Mengele. Seu pai foi fundador da empresa de máquinas agrícolas Karl Mengele & Sons. Tido como uma criança muito inteligente, ele tinha um interesse grande pela música, pelas artes e pela prática da esquiagem.

Foi bem-sucedido durante toda a vida escolar, concluindo o ensino médio em abril de 1930. Posteriormente passou a estudar Filosofia na Universidade de Munique, justamente onde ficava a sede do Partido Nazista. Em 1931, ele se juntou ao Der Stahlhelm, uma organização paramilitar composta principalmente por veteranos da Primeira Guerra Mundial e que teve importância significativa para a chegada de Hitler ao poder. Quando o regime já estava instalado, essa organização foi absorvida pela Sturmabteilung, a organização paramilitar do próprio partido nazista.


Sturmabteilung: organização paramilitar do partido nazista.


Em 1935, Mengele terminou seu doutorado em antropologia pela Universidade de Munique e em 1937 passou a fazer parte do Instituto de Biologia Hereditária e Higiene Racial em Frankfurt. Lá ele conheceu e se tornou assistente de Otmar Freiherr von Verschuer, geneticista alemão que pesquisava fatores genéticos de algumas anomalias como a fissura labial e palatina e a fissura no queixo. Além disso, Otmar tinha muito interesse na pesquisa sobre gêmeos, algo que o próprio Josef levou para frente posteriormente.

Ao escrever uma tese sobre suas pesquisas, ele acabou conquistando mais um doutorado, dessa vez em Medicina pela Universidade de Frankfurt em 1938, se formando com honras. O próprio von Verschuer elogiou a confiabilidade e a capacidade de verbal e de explicação do Mengele. Nessa época ele já estava conhecido no meio acadêmico e começou a chamar a atenção do Partido Nazista. Em julho de 1939, Josef Mengele se casou com Irene Schönbein, uma mulher que ele conheceu quando trabalhava como residente médico em Leipzig. Juntos eles tiveram um filho, Rolf, que nasceu em 1944.


Josef Mengele e Irene Schönbein

Mengele ingressou no Partido Nazista em 1937 e no Esquadrão de Proteção em 1938, recebendo treinamento militar básico junto com a Tropa de infantaria leve de montanha. Em 1940 ele foi convocado para pelas forças armadas para lutar na Segunda Guerra Mundial, servindo como médico até novembro de 1940.

Entre 1941 e 1942, ele foi condecorado com alguns distintivos de honra até ser declarado inapto em meados de 1942, quando foi gravemente ferido em ação perto de Rostov-on-Don, durante as investidas alemãs contra a União Soviética. Depois de se recuperar, ele foi transferido para a Berlim e retomou sua associação com o Otmar von Verschuer, que agora era diretor do Instituto Kaiser Wilhelm de Antropologia, Hereditariedade Humana e Eugenia.

Foi em 42 que o campo de Auschwitz II começou a ser usado para trabalho forçado e extermínio dos prisioneiros, que eram transportados para lá de trem. Uma equipe de médicos seleciona os judeus considerados aptos para o trabalho, que eram separados dos inaptos: esses ficavam algum tempo no local e depois iam para as câmaras de gás, onde a grande maioria das crianças, lactantes, grávidas, idosos e deficientes eram mortos.


Prisioneiros chegando em Auschwitz II


No início de 1943, o Otmar von Verschuer encorajou Josef a solicitar uma transferência para o campo de concentração, com expectativas de poder realizar experimentos nos prisioneiros. Lá ele foi nomeado para o cargo de médico chefe do Zigeunerfamilienlager, um subcampo localizado no complexo principal de Auschwitz. A função dele era coordenar as atividades dos médicos do hospital (médicos judeus que eram forçados a trabalhar) e fazendo visitas aos quartos onde estavam os prisioneiros. Aqueles que não se recuperavam eram enviados para diretamente para a morte. Além disso, ele também participava da seleção de pessoas para experimentos e de estudos com venenos que eram usados nas câmaras de gás.

Em 1943, houve um surto de uma doença chamada noma, uma infecção bacteriana na boca e do rosto, e que estava atingindo principalmente os ciganos. Ele pesquisou a causa e tentou desenvolver um tratamento, tendo ajuda do pediatra judeu Berthold Epstein, professor da Universidade de Praga e prisioneiro.

Para estudar a doença, Josef ordenava a morte dos atingidos, principalmente de crianças. Os médicos então retiravam a cabeça e os órgãos, que eram enviadas para serem estudadas. A pesquisa com a noma durou até 1944, quando o campo cigano foi dissolvido e os ocupantes foram mortos.

No mesmo ano, uma epidemia de tifo atingiu a ala feminina do campo. Para “prevenir a propagação”, mandou 600 mulheres para a câmara de gás. Após isso, o prédio foi limpo e desinfetado, e os ocupantes de um pavilhão vizinho foram transferidos para o local. Esse virou o procedimento padrão de Mengele com outras epidemias posteriores. Por essas ações, recebeu a Cruz de Mérito de Guerra e foi promovido em 1944 a Primeiro Médico do subcampo de Birkenau.


A noma é frequente em regiões pobres da África Subsaariana e destrói

as mucosas da boca e tecidos ao redor


As principais ideias de estudo que Josef Mengele tinha em Auschwitz eram as pesquisas sobre hereditariedade, ou seja, como as características eram passadas entre gerações através da genética. Assim como Otmar von Verschuer, ele desenvolveu um interesse por gêmeos idênticos, assim como pessoas com heterocromia (olhos de duas cores diferentes) e pessoas com deficiência.

A ideia de Mengele era provar a supremacia da hereditariedade sobre o meio ambiente, fortalecendo assim a ideia de que a raça ariana era geneticamente superior. Ele também tinha a intenção de aumentar a taxa de reprodução dos arianos, melhorando as chances de terem gêmeos, por exemplo.

Para realizar os experimentos, a Fundação Alemã de Pesquisa mandou construir um laboratório de patologia em anexo ao Crematório II em Auschwitz II. Seu principal ajudante na época era o patologista húngaro Miklós Nyiszli, judeu e obrigado a trabalhar em Auschwitz em 1944. Nyiszli era responsável por dissecar e preparar amostras laborais para estudo.

Os escolhidos por Mengele eram separados e alojados em um quartel próprio. Nesse local eles recebiam alimentação e acomodação melhor do que no restante do campo. Josef se apresentava como "Tio Mengele" para as crianças, oferecia doces e palavras de apoio, a fim de ganhar a confiança delas. Depois disso, ele começava os seus experimentos monstruosos: amputava membros, infectava os pacientes com doenças, injetava clorofórmio no coração, injetava produtos químicos nos olhos na tentativa de mudar a cor, removia olhos heterocromáticos para serem estudados, extraía dentes e expunha os pacientes ao raio-X em uma quantidade muito além da recomendável. Se um dos gêmeos sobrevivia, ele matava o outro para poder realizar uma comparação dos resultados. -

Sobreviventes relataram que ele realiza vivissecção, ou seja, abria os corpos, sem anestesia, removendo órgãos das vítimas. Um sobrevivente chamado Yitzhak Ganon relatou que Mengele removeu seu rim sem anestesia, e posteriormente forçou ele a voltar a trabalhar no campo sem nenhum remédio. Em outro relato, uma testemunha descreveu uma tentativa de Mengele de “criar” gêmeos siameses, costurando duas crianças gêmeas pelas costas. Eles acabaram morrendo de gangrena depois de vários dias de sofrimento.

Não se sabe exatamente quantas vidas ele tirou, porque além das vítimas diretas dos experimentos, testemunhas relatam que ele matava outros através de espancamento, tiro e injeção letal.


As gêmeas polonesas Maria e Czesława Krajewska: elas foram registrados em Auschwitz em fevereiro de 1943 e morreram em maio e julho, respectivamente


Ao perceberem que iriam perder a guerra, Josef e outros médicos de Auschwitz foram transferidos para outro campo de concentração em janeiro de 1945. A maioria dos registros médicos foram destruídos antes do Exército Vermelho da União Soviética libertar o campo, porém, Mengele levou consigo vários registros dos seus experimentos.

Ele fugiu novamente em 18 de fevereiro, uma semana antes dos soviéticos chegarem no campo onde ele estava. Disfarçado, ele foi o oeste da Tchecoslováquia (atual a República Tcheca), porém foi feito prisioneiro pelos americanos em junho de 1945. Devido à falta de organização e de distribuição da lista de criminosos de guerra, ele acabou sendo liberado.

Depois de obter documentos falsos e de vários meses em fuga, ele passou um tempo trabalhando como lavrador perto de Rosenheim. Em 17 de abril de 1949, ele consegue escapar da Alemanha com o auxílio de uma rede de ex-membros da Schutzstaffel: primeiro ele viajou até Gênova e conseguiu um passaporte com um novo nome, "Helmut Gregor", depois embarcou para a Argentina em julho de 1949.


Tropas soviéticas libertam os prisioneiros do campo de concentração nazista de Auschwitz


Na Argentina, Josef Mengele trabalhou como carpinteiro e morou em uma pensão no subúrbio da cidade de Vicente López. Depois de um tempo, passou a trabalhar como representante daquela empresa familiar que o seu pai tinha aberto anos antes, além de se mudar para Buenos Aires.

Em 1956, ele recebeu uma autorização de residência estrangeira argentina em seu nome real. Por causa disso, obteve um passaporte da Alemanha Ocidental e conseguiu voltar para a Europa. Lá ele se encontrou com o filho, com a cunhada Martha, e até chegou a passar férias na Suíça. Aparentemente sem medo de ser capturado, ele passou a usar o nome verdadeiro quando retornou à Argentina. Ainda em 56, a Martha se mudou junto com o filho dela para a Argentina e os 3 começaram a viver juntos. Josef e Martha se casaram em 1958 e passaram férias no Uruguai.


Josef e Martha


Nesse mesmo ano, ele foi considerado suspeito de praticar medicina sem licença quando uma adolescente morreu após um aborto que ele teria feito, mas foi liberado por falta de provas. Com medo de que as acusações pudessem levar alguém a descobrir os seus crimes de guerra, ele passou um tempo no Paraguai e obteve a cidadania sob o nome de "José Mengele". Nessa época, Martha e o filho dela voltaram para a Alemanha Ocidental.

Dois caçadores de nazistas, os austríacos Simon Wiesenthal e Hermann Langbein estavam trabalhando e coletando informações de testemunhas sobre as atividades do Josef durante a guerra quando encontraram os papéis do divórcio dele, que listavam um endereço em Buenos Aires. Os dois pressionaram as autoridades da Alemanha Ocidental a iniciar o processo de extradição através de um mandado de prisão elaborado em 5 de junho de 1959. A Argentina inicialmente recusou o pedido de extradição porque ele não morava mais no endereço indicado nos documentos. Quando a extradição foi realmente aprovada, ele já tinha fugido de novo. Depois de algumas mudanças, Josef Mengele chegou no Brasil.


Simon Wiesenthal e Hermann Langbein


Assim que chegou por aqui, Josef Mengele passou a se chamar Peter Hochbichler e foi morar em Nova Europa, a 318 km de São Paulo, trabalhando na fazenda do casal Geza e Gitta Stammer. Depois de se mudar com o casal para Serra Negra, ele mandou construir uma torre de 6 metros de altura, dizendo que seria para observar os pássaros. A verdade é que ele passava o dia inteiro vigiando quem entrava ou saía da propriedade, com medo de ser capturado a qualquer momento. Ele estava tão paranoico que deixou o bigode crescer e não saía mais de casa. Se saísse, só usava capa e chapéu, além de levar vários cachorros junto com ele.

A amizade com o casal Stammer acabou quando Geza descobriu que Mengele teve um caso com Gitta, e ele precisou mudar de endereço mais uma vez. Nos atos 70, passou por cidades paulistas como Caieiras, Diadema e Embu, até chegar na capital. Nessa época, informações sobre o seu paradeiro valiam US$ 3,4 milhões.

Em outubro de 1977, ele recebeu a visita inusitada do filho, Rolf, que pela primeira vez questionou o pai sobre o que tinha acontecido em Auschwitz. Em uma entrevista para um programa de TV em 1986, o Rolf, que mudou seu sobrenome para Jenckel e trabalhava como advogado em Munique, relatou que o pai não apresentou culpa ou remorso pelo que tinha feito, se limitando a dizer que estava cumprindo ordens.


Rolf Jenckel: o filho de Josef trocou o sobrenome quando descobriu os crimes do pai


A saúde de Josef já estava abalada: ele havia sofrido um derrame, tinha pressão alta e problemas de equilíbrio devido a uma infecção no ouvido. Em 7 de fevereiro de 1979, enquanto visitava amigos em Bertioga, ele sofreu outro derrame enquanto nadava e se afogou. Seu corpo foi enterrado no cemitério de Nossa Senhora do Rosário, em Embu das Artes, com o nome de Wolfgang Gerhard.

Em maio de 1985, a polícia alemã interceptou cartas endereçadas a um ex-funcionário da família Mengele e desconfiou do conteúdo. As autoridades alemãs decidiram acionar a polícia brasileira, que através do superintendente da PF em São Paulo na época, o delegado Romeu Tuma, realizou uma busca na residência do casal de amigos de Josef e descobriu toda a verdade.

O corpo de Mengele foi exumado e seus restos mortais foram examinados pela equipe do legista Daniel Romero Muñoz, então diretor do setor de antropologia do Instituto Médico Legal de São Paulo. Sete anos depois, através de um exame de DNA feito na Inglaterra, ficou comprovado que realmente era Josef Mengele.

Seu filho nunca requisitou o corpo, e por isso o seu esqueleto é usado, desde 2016, como material didático em aulas de medicina forense da USP. No final das contas, o Anjo da Morte de Auschwitz, que torturou, condenou e matou milhões de pessoas juntamente com seus companheiros nazistas, terminou a vida da mesma forma que tratava suas vítimas: como objeto de estudo.


A equipe de antropologia do Instituto Médico Legal de São Paulo com os restos de Josef Mengele

• FONTES: TodaMatéria, Revista da FAE, El País, Opera Mundi, Britannica, Enciclopédia do Holocausto, History, Biography, BBC, LeMO - Lebendiges Museum Online, Welt, DW, Geo, Europäischer Holocaust-Gedenktag für Sinti und Roma.


• ESPECIALISTAS CONSULTADOS: Felippy Strapasson Hoy e Rodolfo Stival Melegari.

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1 commentaire


Rafael Jurgens
Rafael Jurgens
06 mai 2024

Sou parente desse cara nossa me chamo Raphael Jurgens Mengel

tenho descendência desse cara aí. Queria adquirir mais informações sobre o assunto pois quero dar entrada sobre minha dupla nacilonalidade


email:raphaeljurgens@gmail.com


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