Quando uma estrela mirim dos concursos de beleza desaparece e é encontrada morta, a polícia enfrenta dificuldades em encontrar os responsáveis pelo horrível crime.
Essa é a versão escrita do episódio #13 - JonBenét Ramsey:

JonBenét Patricia Ramsey nasceu no dia 6 de agosto de 1990 em Atlanta, na Geórgia, nos Estados Unidos. Ela era filha do casal John Bennett Ramsey e da Patricia Ramsey, que todos chamavam de Patsy. Ela também tinha um irmão 3 anos mais velho chamado Burke. Uma curiosidade é que o nome da menina é uma junção dos nomes dos seus pais.
Antes de ser casado com Patsy, John foi casado e teve três filhos com outra mulher, que ele se divorciou em 1978. Na época, John era presidente de uma empresa de softwares de computador chamada Access Graphics, e por causa dos negócios ele e a família se mudaram para Boulder, no Colorado, onde ficava a sede da empresa.

A família Ramsey: JonBenét, John, Patsy e Burke
A JonBenét era considerada uma criança muito bonita e carismática, por isso a Patsy decidiu investir na ideia de a filha entrar em concursos de beleza infantis, e deu certo: JonBenét ganhou vários títulos como o Miss Realeza da América, Pequena Miss Charlevoix, Pequena Miss Colorado e a Pequena Miss Beleza Nacional.
A Patsy era muito participativa nesses concursos, até tinha fama de ter um comportamento um tanto agressivo com a filha e com as outras participantes quando ela estava competindo. A própria Patsy tinha sido Miss West Virginia nos anos 70, e muita gente acreditava que ela projetava na filha o sonho de ser uma Miss de reconhecimento internacional.

JonBenét posando com uma faixa após ganhar um concurso de beleza
No Natal de 1996, a família Ramsey participou de uma festa na casa de alguns amigos e a JonBenét estava muito feliz porque ela tinha ganhado uma bicicleta de presente. Quando a família foi para casa, Patsy colocou a filha na cama e foi dormir.
Às 5h30 da manhã, Patsy acorda para fazer o café da manhã e, ao passar pelo quarto da menina, não a encontra. Ao descer as escadas, ela encontra uma carta manuscrita de mais de duas páginas dizendo que a JonBenét tinha sido sequestrada: a nota exigia US$ 118.000 para devolvê-la e dizia que, se eles chamassem a polícia ou o FBI, a menina seria executada.

O bilhete informando o sequestro da pequena JonBenét
Depois de encontrar o bilhete, Patsy ligou em desespero para um casal de amigos, que instruiu ela a ligar para a polícia. A primeira ligação para a polícia foi às 5h52, e ela disse que a filha tinha sido sequestrada e que havia um bilhete com uma série de exigências. O policial Rick French chegou na casa perto das 6h da manhã e fez uma pequena busca pela garota. Depois de não encontrar nada, ele decide chamar reforço.
Como a polícia não isolou o local, diversos amigos da família e outros policiais entraram e saíram da casa dos Ramsey, contaminando toda a cena. A detetive Linda Arndt chegou às 8h, colheu alguns depoimentos e ficou esperando os sequestradores entrarem em contato, porém isso não aconteceu.

A casa da família Ramsey: falta de isolamento do local prejudicou a coleta de provas
No começo da tarde, a detetive Arndt pediu ajuda para John Ramsey e um amigo da família para revistar a casa procurando por alguma coisa errada. John desdeu até o porão e encontrou, atrás de uma porta trancada, o corpo de JonBenét: ela estava coberta com um cobertor, com um cordão de nylon em torno do pescoço e fita adesiva na boca. O pai pegou o corpo da criança e o levou para cima, contaminando evidências que poderiam estar nela.
A autópsia revelou que JonBenét havia sido morta por estrangulamento e apresentava uma fratura no crânio. Também foi encontrada uma lesão vaginal, sangue e um DNA masculino na sua roupa íntima. A polícia identificou que o estrangulamento foi realizado utilizando um garrote feito com a corda de nylon e o cabo quebrado de um pincel.
Alguns dias após o assassinato, os Ramsey voltaram para sua antiga cidade natal, Atlanta. No dia 31 de dezembro foi realizado o funeral de JonBenét, em Marietta, na Geórgia. A garota foi enterrada ao lado de sua meia-irmã Elizabeth, que morreu em um acidente de carro em 1992. Mais de 200 pessoas entre familiares e amigos participam da cerimônia.

Lapide de JonBenét Ramsey: ela está enterrada em Marietta, na Geórgia
Com a cena do crime comprometida, os investigadores tiveram pouco material para trabalhar. Os membros da família estavam colaborando com as investigações e forneceram sangue, amostras de cabelo e de caligrafia para a polícia. O primeiro depoimento de John e Patsy durou mais de duas horas, enquanto o irmão, Burke, foi entrevistado posteriormente.
A autópsia revelou que havia um material vegetal que o médico legista acreditava ser abacaxi, e que a garota deveria ter comido algumas horas antes de sua morte. Fotografias da cena do crime mostram que, na cozinha, havia uma tigela de abacaxi na mesa com uma colher dentro. Estranhamente, John e Patsy disseram que não haviam colocado a tigela lá ou dado abacaxi para JonBenét. A polícia encontrou as impressões digitais de Burke na tigela, embora os pais afirmarem que ele havia dormido a noite inteira e só acordou quando a polícia chegou.

Fotos da cena do crime mostram uma tigela com abacaxi sobre a mesa
Outra pista que apontava que o crime foi cometido dentro da casa foram cerdas do pincel usado no garrote encontradas em uma banheira. O pincel era de Patsy, que o utilizava para fazer artesanato. Quanto a nota exigindo dinheiro, John alegou que o valor pedido era quase idêntico ao seu bônus de Natal do ano anterior, o que sugeria que a pessoa que cometeu o crime sabia dessa informação. A polícia investigou diversos funcionários da Access Graphics que poderiam ter conhecido do valor do bônus de Natal, porém todos foram descartados.
A nota de resgate chamou a atenção do FBI, que a considerou incomum por ser extremamente longa, sendo que dificilmente ela teria sido escrita na cena do crime. As investigações mostraram que havia impressões digitais de Patsy e dos policiais que manusearam a carta, e que ela foi escrita utilizando papel e caneta da casa dos Ramsey. Nessa época, um grupo de investigação do Estado do Colorado acreditava que a carta teria sido escrita pela Patsy, porém um patologista forense chamado Michael Baden, um tribunal federal da época e seis especialistas em caligrafia descartaram a participação dela.
No dia 1º de janeiro de 1997, John e Patsy dão uma entrevista para a CNN de Atlanta, dizendo: “Há um assassino à solta, se eu fosse um morador de Boulder, diria aos meus amigos para manter seus bebês perto de você”. Patsy acrescentou: “A América está sofrendo porque perdeu a fé na família americana, somos uma família cristã e temente a Deus. Nós amamos nossos filhos. Faríamos qualquer coisa pelos nossos filhos”.
Entrevista de John e Patsy para a CNN em 1997
Com as provas de DNA inconclusivas e o bilhete estranho, a principal suspeita cai sobre a própria família. Apesar disso, mais de 1.600 pessoas foram consideradas de interesse para o caso. Um detetive aposentado chamado Lou Smit começou a ajudar a promotoria do condado de Boulder no caso, e em maio de 1998 ele apresentou provas de que os Ramsey não estavam envolvidos na morte da filha.
Nessa época começou um impasse entre a polícia de Boulder e a promotoria do estado, além de uma pressão da mídia e da população para que o caso fosse solucionado. Por causa disso, o governador do Colorado da época nomeou um promotor especial chamado Michael Kane para iniciar um júri. Depois de um tempo, os dois principais investigadores pediram demissão: Lou Smit acreditava que a investigação focava unicamente na culpa da família, enquanto o investigador Steve Thomas disse que o escritório do promotor interferiu e falhou em apoiar a investigação policial do caso, além de comentar sobre o péssimo trabalho que a polícia tinha feito na cena do crime.
Um grande júri foi convocado a partir de 1998 para considerar indiciar o John e a Patsy: os membros do júri acusaram os Ramsey de colocar a filha em risco e de obstruir uma investigação de assassinato. Apesar disso, o promotor distrital do condado de Boulder resolveu não processar a família porque ele não acreditava que conseguiria provar a culpa do casal. O processo de investigação passou por diferentes promotores nos anos seguintes, levando em consideração outras teorias e revisando provas antigas utilizando novas técnicas forenses, porém o caso segue sem uma conclusão.

JonBenét posa para um ensaio fotográfico
SUSPEITOS:
• FAMÍLIA RAMSEY:
Por causa do pincel, da carta e da falta de evidências contra um intruso, os Ramsey foram considerados os principais suspeitos: a teoria principal seria a de que Patsy, John ou Burke atingiram JonBenét na cabeça e a garota acabou desmaiando. Acreditando que ela já estava morta, eles começaram um plano para fingir um sequestro mesmo com ela já morta, incluindo o estrangulamento.
Entre a meia noite e às 2 da manhã do dia em que ela “desapareceu”, dois vizinhos disseram terem visto luzes acessas, gritos e um som de metal no concreto. Além disso, o fato de os pais não terem procurado na casa inteira antes de chamarem a polícia também depõem contra a família. Em 1999, o governador Bill Owens botou ainda mais lenha na fogueira dizendo que John e Patsy tinham que "parar de se esconder atrás de seus advogados e de relações públicas de sua empresa". Apesar disso, a família não tinha nenhum histórico de violência, e um psicólogo infantil que ajudou durante as entrevistas policiais afirmou que os Ramsey “tinham relações familiares saudáveis e carinhosas".
Em 2016, a CBS levou ao ar um documentário especial do caso chamado “The Case of: JonBenét Ramsey”, no qual um grupo de especialistas avalia as evidências e teorizaram que Burke teria atingido sua irmã na cabeça depois que ela comeu um pedaço de abacaxi de sua tigela, mas sem a intenção de matá-la. Com medo do filho ser preso, John e Patsy escreveram a carta e forjaram o desaparecimento de JonBenét. Por causa do uso do seu nome, Burke Ramsey entrou com um processo de difamação contra a CBS, os produtores do programa e vários de seus participantes.
Em contrapartida, ele deu uma entrevista exclusiva no programa do Dr. Phil, um dos mais sensacionalistas da TV americana. Na época com 29 anos, ele disse que todo o caso mexeu muito com ele e com sua família, mas que eles sempre mantiveram a suas convicções de inocência pois nunca houve prova suficiente para incriminá-los, inclusive de DNA.
Entrevista completa de Burke ao programa do Dr. Phil
• GARY OLIVA:
Gary Oliva, um homem que na época tinha 32 anos, já era conhecido da polícia por ter condenações por crimes sexuais. Na época do caso ele morava na vizinhança e já foi visto próximo da casa. Em 2000 ele foi preso com drogas, e a polícia encontrou uma foto de JonBenét em sua mochila.
Um amigo de Gary chamado Michael Vail disse a polícia que, não muito tempo depois do assassinato, Gary ligou para ele e confessou o crime: “Nunca amei ninguém como amei JonBenét, eu a deixei dormir e sua cabeça bateu e eu assisti ela morrer. Foi um acidente. Por favor, acredite em mim. Ela não era como as outras crianças". Para piorar, o garrote utilizado para estrangular JonBenét era muito semelhante com um usado em um incidente quando Gary tentou estrangular a própria mãe.
Ollie Gray, o investigador particular da família Ramsey, acreditava que Gary era um dos mais prováveis suspeitos, e criticou a polícia por não o investigar de forma mais abrangente. Em 2020, Gary foi acusado e preso pelos crimes de exploração sexual e posse de pornografia infantil. Apesar disso, o DNA dele não foi compatível com o material encontrado em JonBenét.

Gary Oliva em foto na prisão
• BILL MCREYNOLDS:
Bill McReynolds era um senhor amigo dos Ramseys e conhecido por ser gentil e amigável. Uma semana antes do crime, ele tinha se vestido de Papai Noel para entreter as crianças da vizinhança em uma reunião de Natal que aconteceu na casa da família. Algumas pessoas presentes na festa disseram que Bill passou muito tempo com JonBenét.
Ele visitou a garota dois dias antes do crime, e ela teria dado a ele um potinho com glitter de presente. Ele teria guardado esse potinho como algo muito especial, inclusive o levado para a sala cirúrgica quando ele fez uma cirurgia no coração. O item teria tanta importância para ele que ele teria dito a esposa para misturar o conteúdo as suas cinzas quando ele morresse.
Outras pistas circunstanciais que ligariam Bill ao caso: sua própria filha tinha sido sequestrada e assassinada em 1974 e ele escreveu uma peça de teatro em que uma das cenas consistia em uma criança sendo estuprada e morta em um porão. Apesar da história estranha ter saído no jornal Denver Post, a polícia não conseguiu provar que ela era real.

Bill McReynolds e sua esposa
• LINDA E MERVIN HOFFMAN-PUGH:
Linda Hoffman-Pugh e seu marido Mervin haviam trabalhado para a família Ramsey como governanta e faz-tudo, respectivamente. Era dito que Linda, mesmo não trabalhando mais na casa, ainda mantinha uma cópia da chave da residência. Pouco tempo antes do crime, Linda pediu um empréstimo para os ex-patrões, mas eles recusaram.
Na mesma noite em que o corpo foi achado, a polícia foi até a casa de Linda e Mervin, colheu impressões, cabelo e pediu para que ela escrevesse o número 180.000 para comparar com o pedido de resgate. Linda testemunhou durante mais de 8 horas, e fez diversas acusações contra Patsy, incluindo que ela tinha múltiplas personalidades e que ficava constantemente chateada e irritada com a filha.
Segundo a teoria da época, Linda e Mervin, desesperados por dinheiro, sequestraram JonBenét, a levaram até o porão e escreveram o bilhete de resgate com materiais encontrados na própria casa. O casal poderia saber do bônus de Natal de John e também tinha conhecimento da casa e de onde se esconder. Em algum momento o sequestro deu errado e eles acabaram matando a garota. Nenhum dos dois tinham álibis convincentes, apenas disseram que estavam dormindo em casa aquela noite. Apesar disso, as evidências contra os dois eram apenas circunstanciais, e eles nunca foram formalmente acusados do crime.

Linda Hoffman-Pugh
• JOHN MARK KARR:
Em 2006 o caso de JonBenét voltou à tona quando o ex-professor John Mark Karr confessou, via e-mail para o jornalista Michael Tracey, que ele teria estrangulado e abusado sexualmente de JonBenét em 1996, além de dar diversos detalhes gráficos dos crimes.
Na sua confissão, Karr utilizou diversas marcas textuais parecidas com utilizadas pela nota de sequestro, além de saber um apelido intimido de Patsy que não havia sido revelado em público. Ele ainda revelou que estava apaixonado por JonBenét e que o ferimento na sua cabeça foi feito com ele com uma lanterna. Naquela época, John morava na Tailândia e já tinha sido preso por posse de pornografia infantil. Michael Tracey denunciou John Karr à polícia, ele foi preso em Bangkok e levado para ser interrogado em Boulder.
Para a surpresa de todos, quando o caso parecia estar resolvido, Karr foi liberado depois que seu DNA não correspondeu ao encontrado em JonBenét. As autoridades também não conseguiram encontrar qualquer sinal de que ele já tivesse passado pela cidade de Boulder. Karr então foi totalmente descartado, e a polícia acredita que ele apenas queria ganhar fama com a confissão. Hoje ele mudou de nome e vive na região noroeste do país.

John Mark Karr
Existem muitos documentários sobre o caso, como “Quem é JonBenét”, produzido pela Netflix em 2017: aqui a história é contada através de entrevistas com atores locais que realizam testes para uma dramatização da própria história do caso, misturando momentos de encenação com ideias do que teria acontecido com a JonBenét. Outro documentário é o recente “JonBenet Ramsey: What Really Happened?”, série do Discovery+ que traz muito conteúdo investigativo inédito como cartas, áudios e entrevistas com os envolvidos.
Patsy Ramsey morreu em 2006 de câncer de ovário, aos 49 anos. Ela foi enterrada ao lado da filha. Já o John permanece vivo, mora em Michigan e se casou com uma mulher chamada em 2011. Apesar de todos os esforços modernos e da época para a resolução do caso, e mesmo já passando 25 anos, a identidade de quem matou JonBenét Ramsey permanece um mistério.

• FONTES: Quem é JonBenet, Ferlap, The Cinemaholic, People, ABC News, RollingStone, In Touch Weekly, Biography, The Denver Post, BuzzFeed Unsolved.
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